Cinco da manhã, festa na casa de pedra. Céu mutante. Noite tenebrosa. Rio Vermelho. Despediu-se dos amigos. Saiu grogue, sozinho, pernas inseguras. Dobrou a rua, andou cem passos. Vinha de lá um jovem encasacado goticamente. Naquele calor quase matinal, olhos vidrados, identificou-se. Que horas são? Tirou o celular, ingenuamente, e disse. Guardou. Você tem dois reais? Cara, tenho apenas essas moedas. Deu. Passa o resto. Como? Apoiou o braço em seus ombros e começaram a caminhar juntos, disfarçadamente. Alguns passos seguem, como os bons amigos fazem. Caiu em si. Deu um pequeno empurrão no ladrão. É um assalto, porra, se ligue! Eu quero a grana, só isso. Fleumático, o assaltado; assustado, o assaltante. Vamos ser honestos um com o outro, hermano! Você me pediu e eu lhe dei. Não tenho mais nada, segue seu caminho, man! Bêbado, inconsequente, ainda retribuiu o braço em seu ombro. Gaiato. Não me toque! Não me toque! Disse o ladrão. Qual é, brother, vamos ficar de boa! Ele riu, tímido. Foi recíproco. Era um riso incrivelmente terno face a hostilidade rompida. Confrontou-lhe um evento. Revelou-se desconcertado com o viés de um medo revertido, quiçá desarmado. Deram-se as costas e prosseguiram harmônicos na trilha de um amanhecer, como sugerido. Nem tudo são flores, queria logo sair dali para não confrontar a cólera de qualquer arrependimento fugaz. Chamou o primeiro taxi que passava. Abriu a porta. Um som estridente de hip hop americano. Gostou. O motorista efusivo foi se apresentando. Falou do que havia acontecido minutos atrás; o taxista também relatou a sua noite perigosa. Estava em alta, como dizem os que vivem mais de um dia sem repouso. Começou a falar em códigos outsiders. Queria saber se o rapaz gostava da bicha, do branco. Idioma fluente, sinal positivo. Serviu o cliente com uma dose sua, do virote, como se fosse um estranho brinde pelo retorno daquela marginalizada simpatia.
sexta-feira, novembro 06, 2015
Simpatias
Cinco da manhã, festa na casa de pedra. Céu mutante. Noite tenebrosa. Rio Vermelho. Despediu-se dos amigos. Saiu grogue, sozinho, pernas inseguras. Dobrou a rua, andou cem passos. Vinha de lá um jovem encasacado goticamente. Naquele calor quase matinal, olhos vidrados, identificou-se. Que horas são? Tirou o celular, ingenuamente, e disse. Guardou. Você tem dois reais? Cara, tenho apenas essas moedas. Deu. Passa o resto. Como? Apoiou o braço em seus ombros e começaram a caminhar juntos, disfarçadamente. Alguns passos seguem, como os bons amigos fazem. Caiu em si. Deu um pequeno empurrão no ladrão. É um assalto, porra, se ligue! Eu quero a grana, só isso. Fleumático, o assaltado; assustado, o assaltante. Vamos ser honestos um com o outro, hermano! Você me pediu e eu lhe dei. Não tenho mais nada, segue seu caminho, man! Bêbado, inconsequente, ainda retribuiu o braço em seu ombro. Gaiato. Não me toque! Não me toque! Disse o ladrão. Qual é, brother, vamos ficar de boa! Ele riu, tímido. Foi recíproco. Era um riso incrivelmente terno face a hostilidade rompida. Confrontou-lhe um evento. Revelou-se desconcertado com o viés de um medo revertido, quiçá desarmado. Deram-se as costas e prosseguiram harmônicos na trilha de um amanhecer, como sugerido. Nem tudo são flores, queria logo sair dali para não confrontar a cólera de qualquer arrependimento fugaz. Chamou o primeiro taxi que passava. Abriu a porta. Um som estridente de hip hop americano. Gostou. O motorista efusivo foi se apresentando. Falou do que havia acontecido minutos atrás; o taxista também relatou a sua noite perigosa. Estava em alta, como dizem os que vivem mais de um dia sem repouso. Começou a falar em códigos outsiders. Queria saber se o rapaz gostava da bicha, do branco. Idioma fluente, sinal positivo. Serviu o cliente com uma dose sua, do virote, como se fosse um estranho brinde pelo retorno daquela marginalizada simpatia.